segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Navegar é preciso...


"Daqui vinte anos você estará mais decepcionado pelas coisas que você não fez do que pelas coisas que você fez. Portanto livre-se das amarras. Navegue longe dos portos seguros. Pegue os ventos da aventura em suas velas. Explore. Sonhe. Descubra."

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Novos ares

(...) quando avistou de cima das nuvens a cidade de Paris, foi impossível segurar as lágrimas. De felicidade. De supra certeza.
Enfim pousaria depois de longas horas de voô. Não conseguira pregar os olhos um segundo sequer, ficara pensando em tudo que acontecera nos últimos anos...
Ao pegar o táxi no aeroporto, pediu, num inglês ruim, que a deixasse bem no início da Champs Élysées.
Queria caminhar por toda a avenida. E caminhou. Depois, entrou num pequeno bistrô; pediu um croissant e um café expresso. Pensou. Refletiu. Chorou novamente; lágrimas de renovação!
Há tempos precisava dessa viagem e agora seria pra nunca mais voltar.
Mudou do Brasil, ela já não aguentava mais ver tanta sacanagem em seu país. Era do tipo patriota, acredita?
Escolheu a França: desde criança tinha fascínio pela Torre Eiffel e pelo idioma francês. Largou o emprego. Talvez agora aquele curso de fotografia que fizera na adolescência serviria pra alguma coisa. Largou as mesmas ruas e esquinas que sempre caminhava. Queria dar passos mais calmos. Deixou pra trás os poucos amigos que tinha, mas eram leais até o último segundo.
Pensou em tudo. Nos amores perdidos, nas saudades e no sonho agora concretizado. Precisava respirar novos ares.
Coincidência ou não, como que divinamente, no bistrô tocava "Je ne regrette rien". Riu e o coração acelerou. Gostou especificamente da parte que diz:
"Non... rien de rien...
Non... je ne regrette rien
C'est payé, balayé, oublié,
Je me fous du passé!"


Sabe quando o coração parece sair pela boca? Quando uma euforia incomensurável toma conta da alma?
Bebeu o café lentamente, queria apreciar cada gole de sua nova vida; e o vento soprava suave. Uma serenidade ímpar e transcedental tomou conta daquele instante, era como se Deus estivesse aplaudindo orgulhoso sua corajosa decisão de mudar de vida. Talvez Ele estivesse...
Talvez Ele de fato aplauda quem toma certas atitudes...

sábado, 10 de setembro de 2011

Até quando?

Ao som de "Nada como um dia após o outro" - Racionais; mas também poderia ser "Até quando" - Gabriel, o pensador

 São 4h30 da manhã e a maior parte da população ainda dorme quando Nelson Silvério dos Santos, 48 anos e 4 filhos pra criar fecha o pequeno portão de seu barraco. Ele confere se o cadeado está bem trancado. Não que muitos bens possam ser roubados. Lá dentro ficaram uma geladeira que tem 12 anos de idade, uma TV com o seletor quebrado, um sofá com molas à mostra e uma mesa na cozinha. Seu Nelson é pedreiro. Levará pelo menos duas horas e meia para chegar à obra onde trabalha, nos Jardins, bairro nobre de São Paulo. A favela onde ele mora traz, no nome, um resumo do que será seu dia. Um resumo do que tem sido a sua vida. Vila Paciência.
Até chegar a estação do metrô são 40 minutos de caminhada. Ele não pode pegar um ônibus. “Ou é a passagem ou é o café”, conforma-se. A estação está lotada. e, quando as portas da composição se abrem, Seu Nelson fica só olhando. Já foi empurrado, caiu nos trilhos, ficou com medo de morrer. Desistiu de disputar seu lugar no trem. Desistiu também de disputar outros lugares. Está conformado. Ele segue a viagem, pendurado onde dá. Está acostumado a viver assim. Equilibrando-se. Pendurado.

O metrô está tão lotado que é impossível fazer uma boa foto. Depois, percebo que a única que consegui ficou assim, meio borrada. O que ela mostra, porém, é muito nítido. Pergunto se Seu Nelson sabe sobre o escândalo dos jatinhos de Brasília. Ele não consegue entender. “Mas eles são amigos, né? Ou deve favor ao outro?”. Respondo que eles dizem que não. “Mas como é que emprestam avião assim, do nada?”. Ele não entende.Ninguém nunca emprestou um jatinho a Seu Nelson.

Créditos da imagem: Madrugada na periferia
Óleo sobre tela, 50×70 cm
Carlos Cabanita, 1996